Fluminense x flamengo - 04/09/2002

Crônica de um fracasso anunciado

Quando soube que Beto não jogaria e Athirson voltaria comecei a prever o pior. Cheguei cedo ao Maraca e quase todos os profissionais da imprensa achavam que o Flu venceria. Discordava. Um pessimismo tomava conta de mim, apesar de eu tentar disfarçar. Analisando posição por posição entre os titulares, para mim, só ganhávamos em três. Marcão, Magno Alves e Romário são melhores do que Jorginho, Liedson e Zé Carlos. De resto, o urubu tem uma visível superioridade técnica, mesmo com os seus jogadores também limitados.

E por falar em técnica, no banco deles havia realmente um treinador. Já no nosso ... Bem, quando vi o Renato Gaúcho entrar em campo com uma camisa de uma Churrascaria perdi o respeito por ele. O Fluminense merece consideração, mas a desorganização é tanta que dá respaldo a palhaçadas como esta. Pelo visto será mais um ídolo que vai se queimar, desnecessariamente, com a torcida. E olha que ele já foi técnico uma vez e as lembranças são as piores possíveis. Não aprendem a lição.

Entramos em campo de camisa branca e short grená, combinação que não me agrada. O Maraca recebia um bom público para um meio de semana, mais de 56 mil pagantes, com maioria rubro-negra em todos os setores. Era um verdadeiro espetáculo para os gringos verem. A torcida tricolor, mais inibida e de luto pela lamentável morte de um dos seus integrantes, gritava apenas pelo setor verde das arquibancadas. Já a do Fla, dentro do campo dá para sentir bem isso, pressionava de todos os lados.

A partida começou e na primeira chegada do Flu aconteceu algo inesperado. Falta pelo lado direito. A torcida começou a gritar o tradicional coro Suzana Werner-Ronaldinho. Flávio alçou a bola na área (finalmente acertou um cruzamento) e César (ele mesmo) cabeceou para o fundo dos barbantes, com o apoio de Júlio César (mais uma vez falhou ao ouvir a música). 1 a 0 Flu, a um minuto de jogo. Eu estava ao lado da comissão técnica tricolor, local onde só vi o Flu vencer, e nem vibrei muito. Seria estranho vencermos um Fla-Flu com um gol de César e mais esquisito ainda ganharmos sem levar gol. Parecia que sentia o pior.

E o pior não demorou a vir. O jogo estava corrido demais. Era lá e cá. Muita emoção, como todo Fla-Flu. Aos 5 minutos, Murilo pisa em falso e aparentemente sente o tornozelo direito. O médico Michel Simoni, que estava bem perto de mim, foi atendê-lo. Quando Simoni voltou, falou algo no ouvido de Renato, que de imediato mostrou uma grande irritação. Fernando Henrique começou a aquecer. Perto de mim estava o doutor Luis Galo. Vi sua cara de preocupação e pelo seu olhar achei que não dava mais para o Murilo. Se ele podia continuar, não posso afirmar com certeza. Só sei que Renato não quis colocar o goleiro reserva e isto poderia ser um grande erro.

Não só poderia, como foi. Athirson, o melhor lateral-esquerdo em atividade no país, infernizava pela esquerda com o Iranildo. Numa das jogadas deles, aos 12 minutos, Athirson penetrou sem ser incomodado, chutou fraco, a bola foi até Liedson, ele conseguiu furar, mas Murilo aceitou. Os experientes atletas tricolores pediram para tomar um gol e os novatos dos outro lado respeitaram a ordem dos mais velhos. Empate. 1 a 1.

A partir daí só deu Fla. O gol da virada parecia ser questão de tempo. O Flu não conseguia avançar no ataque. A torcida rubro-negra estava em evidente sincronia com o time, empurrando a equipe para frente. Aos 16´, Marquinhos ficou só olhando, Alessandro cruzou, César não subiu e Zé Carlos escorou no canto direito de Murilo, que pulou atrasado. 1 a 2. Era tudo que eles queriam. O Maraca explodiu.

O jogo passou a ter um ritmo ainda mais alucinante. Até os 35 minutos só deu Flamengo. O Flu teve sorte de não tomar mais gols, até porque a zaga, uma dupla com perna presa, colaborava ao máximo com o adversário. Dos 35 em diante, o Flu cresceu no jogo e deu a impressão que empataria. Zada, em jogadas individuais, pelo menos tentava algo. Contudo foi mera ilusão e o primeiro tempo acabou com o placar adverso.

Cheguei no Magno e ele resumiu a situação da seguinte forma: ?Fizemos o gol em um minuto e sofremos a virada em dois.? Ele estava visivelmente abatido por causa de nossa defesa. Os repórteres da rádio foram chegando quase sempre nos atletas mais famosos. Na hora me toquei no problema do Murilo e quis perguntar se ele estava bem. Nosso goleiro falou que sim.

No intervalo resolvi mudar de local. Sou um pouco supersticioso, como a maioria dos fanáticos por futebol, e já que não estava dando sorte para o Flu onde escolhi ficar (e costumava dar sorte por lá, onde só assistia vitórias), resolvi ir para um lugar que sempre dei azar para o Fla (já cobri alguns jogos deles e em nenhum deles houve vitória rubro-negra). Se o Flu não ajudava com a sorte que eu tentava passar a ele, de repente o Fla colaborava com o azar que queria para eles. Quem sabe dava certo ...

O segundo tempo começou bem equilibrado, com o Flu ainda mais a frente do que estava no final da primeira etapa. A torcida tricolor cantou ?A benção João de Deus? e o time corria em busca do empate. Ao menos, com o Renato Gaúcho, dava para ver que os jogadores corriam, só não dava para ver tática nenhuma, pois não havia direções definidas. O Flu insistia em usar o meio. Flávio até tentava avançar pelas pontas, mas Athirson impedia todas as tentativas de investida. Do outro lado, Marquinhos nem tentava algo.

Aos 10 minutos, Yan e Roni foram chamados pelo Renato. Vi na placa que saíram Marquinhos e Fabinho. Eles estavam esperando a bola sair para entrar em campo. Fabinho e Marquinhos já sabiam que iam sair. No entanto, antes da substituição ser efetuada aconteceu tudo que não poderia.

Deu uma pane generalizada (para variar) no setor defensivo do Flu. Na primeira chegada deles com perigo, a impressão foi que o time parou para ver os rubro-negros jogarem. Aos 13´, o raçudo Fábio Baiano (impressionante como ele não perde uma dividida, ganhou todas com o Marcão) penetrou com tranqüilidade pela direita (sempre por este setor, é a mina), cruzou rasteiro e Zé Carlos, livre, na cara do gol, só teve o trabalho de completar. 1 a 3. Ainda tive que aturar a comemoração deles ao meu lado e perto do banco tricolor.

Após as mexidas não precisava ser nenhum entendedor de futebol para saber que levaríamos uma goleada. Marquinhos era uma nulidade em campo, mas Yan é uma nulidade por natureza. Fabinho (que já devia ter se aposentado) só sabe destruir e tomar cartões (dessa vez não levou), mas Roni só sabe perder gols e levar a torcida ao desespero.

O quarto gol do Fla estava muito mais próximo do que o segundo nosso. Eles chegavam como queriam e comecei a achar que se terminasse daquele jeito já seria lucro. Eles não venciam há um ano no Maraca. A mídia começou a falar que os jogadores rubro-negros tinham fobia do estádio. Além disso, Romário e Renato, que tiveram passagens pela Gávea, falaram demais antes do jogo. Faltava humildade ao Flu, algo que sempre foi a nossa marca, e dava para ver que os flamenguistas estavam mordidos em campo.

Uma cena previsível não demorou a acontecer. O roteiro do filme dramático reservou que até Iranildo, o Chuchu, fizesse um gol. Aos 23´, em mais um rápido contra-ataque deles, Iranildo chutou forte, na entrada da área, e sacudiu a rede. 1 a 4. Eles devolviam o placar do último jogo, quando impedimos o tetra rubro-negro.

Dessa vez, ao contrário do jogo contra o Cruzeiro no domingo passado, o Fla fazia todos os gols possíveis. Cobri a partida Fla x Cruzeiro, sendo repórter do time mineiro. Foi inacreditável a quantidade de gols perdidos pelo ataque rubro-negro, principalmente o Liedson (ele foi vaiado e muito perseguido pela torcida nesta partida). Temia que a cota acumulada de gols desperdiçados deles fosse descontada contra nós. Nunca fiquei tão incomodado por ter um temor confirmado.

Após o quatro gol tomado, o Flu, com um mínimo de vergonha na cara, tentou amenizar o vexame, mas Roni conseguiu perder um gol incrível. Romário, num toque genial, deixou Roni na cara do gol. Júlio César estava batido, ele deu o rotineiro peteleco, a bola ia entrando, mas foi tão fraco que o bom zagueiro André cortou.

Aos 30´, penal para o Flu. Edílson Soares da Silva, o Michael Jackson, não tinha marcado tiro livre indireto em duas claras atrasadas de bola ao Fla, mas desta vez marcou bem o pênalti. Alguém do Fla, estava uma confusão na área e minha posição não era boa para ver, colocou a mão na bola, impedindo o gol tricolor.

Romário pegou a bola e poderia marcar o seu centésimo contra o clube que ele diz ser o seu de coração. A torcida deles começou a gritar ?Júlio César !!! Júlio César !!!? Temia que o marrento goleiro (ele só dá entrevistas quando o time ganha e sempre que perde joga para a galera, com choros, brigas e outras coisas) defendesse. Só faltava essa. Ele foi companheiro de time do Romário e devem ter treinado muitas cobranças juntos. Romário, que geralmente escolhe um canto e chuta rasteiro, chutou para o alto, como na Copa de 94. Dessa vez a bola bateu na trave e não entrou, lembrando pênalti perdido por Edmundo, contra o Vasco, quando ele era jogador do Cruzeiro.

A festa rubro-negra estava completa. A torcida tricolor foi quase toda para casa e dali em diante foi duro ouvir uma série de músicas. Eles começaram a pegar no pé dos dois mais carismáticos tricolores, que já tiveram do lado deles. Adotaram um bicho para cada. Cantaram que o Romário é urubu e o Renato é viado. Depois, com o trauma do centenário deles, também quiseram detonar o nosso, cantando músicas que criamos para eles. A principal era que o nosso centenário foi para aquela casa ... O pior foi ouvir algumas antigas, ouvidas em demasia no final da década de 90, como ?terceira divisão? e ?vergonha do Brasil?.

Tudo dava certo a eles e faltava o gol de Fábio Baiano. Todos que tentaram fazer já tinham balançado as redes, o ex-gremista ainda não. Em mais um contra-ataque muito rápido, o mano-a-mano do ataque deles com nossa defesa mostrou que era uma covardia. Fábio Baiano foi lançado pelo alto, ele estava marcado por César, a bola era toda de nosso zagueiro, mas ele furou a cabeçada ... É aquilo. Quando ele fez nosso gol no início, comecei a imaginar quantos ele iria entregar. E ele entregou mais um. Fábio Baiano penetrou, deu um bico e mais uma vez, como em todas as bolas que foram em direção ao gol, Murilo não fez nada. 1 a 5. Tal placar foi a maior goleada do Flu em todos os tempos neste clássico, em 1943. Do lado deles há mais goleadas, mas felizmente, comigo presente, já tinha visto vencermos de 4 a 2, 3 a 0, 4 a 1, mas nunca sofri ao vivo uma goleada para eles.

Comecei a torcer para não sair mais. O Flu não existia em campo. A defesa lembrava aquela ?Porta dos Desesperados?, quadro do antigo programa do tricolor Sergio Malandro. O meio, sem Beto, também não existia, até porque Zada sumiu no segundo tempo. Era um pesadelo. Dava vontade de chorar.

Os rubro-negros foram definitivamente à loucura quando o placar anunciou as derrotas de Vasco e Botafogo. Os flamenguistas começaram a gritar ?olé? e seus jogadores, identificados com a torcida (ao contrário dos nossos), entraram no clima de euforia, passando a perder várias oportunidades por pura displicência. Lembrou a equipe rubro-negra chilena da preliminar, que foi campeã do Campeonato dos Petroleiros, mas perdeu vários gols por brincar demais.

O ataque do Flu era impotente. Romário estava visivelmente abatido (parecia o Pelé na propaganda do Viagra) e Magno Alves nem era notado em campo. Era tão fácil passar por nossos jogadores, que até Júlio César arriscava os seus dribles. E numa dessas brincadeiras, aos 46´, o maior ídolo da torcida deles se enrolou com Evandro e a bola sobrou para Roni. O gol estava totalmente vazio e a bola sobrou para Roni na pequena área. Ele ainda precisou dominar para depois chutar, diminuindo o vexame. 2 a 5 e, logo em seguida, o fatídico evento teve o seu fim.

Entrevistei o Zada que lamentou o fato de Renato ter estreado daquela forma e disse que o time vai melhorar. Cheguei no Romário, mas ele não queria e mal conseguia falar. Em seguida fui ao vestiário que estava num clima de velório. A porta estava demorando a abrir e como a rádio estava repercutindo muito mais a vitória do Fla do que a derrota do Flu, as entrevistas no vestiário tricolor, para eles, não seriam necessárias. Estava muito triste, meu amigo Fabio Pitman ligou e resolvi ir logo para casa.

No caminho ainda recebi vários telefonemas de flamenguistas zoando. Só diziam ?Cinco muito, Daniel.? Peguei o metrô e só dava flamenguista. Ainda tive que atuar um bêbado gritando ?Um, dois, três, quatro, cinco?, mexendo os dedos da mão e falando ?Cuein !!! Cuein !!!? Isso estava me martelando. Parecia que ouvia meu sobrenome ser ironizado ... ?Cohen !!! Cohen !!!?. Pensei na minha ex que sempre falava para mim: ?Muita calma nessa hora.?

O pior é que nesta quinta-feira tenho a minha formatura. Planejava ficar com a camisa do Flu e a bandeira tricolor, até porque tocará o nosso hino quando o meu nome for anunciado. Claro que meus planos não mudaram. Acima de tudo está a Instituição Fluminense Football Club. O clube e a torcida não merecem isto. O pior é que a minha formatura do segundo grau foi no dia seguinte ao primeiro rebaixamento tricolor. Que sina !!!

Continuo de cabeça quente, mas meu pensamento momentâneo é fugir da segunda divisão. Temos que fazer os mais de 27 pontos que o mestre Ari Furtado Small previu para evitarmos nossa queda. Até porque se cairmos de novo ... Bem, prefiro nem imaginar nas conseqüências caso isto ocorra. Coitada da Unimed, que já está mal, e pode ter um grande prejuízo com o investimento no Romário. No entanto, mais coitados ainda são os torcedores tricolores, que amam o clube, mas não recebem um mínimo amor dos jogadores em troca. Amigos conselhos, ajam, por favor !!!

Daniel Cohen - daniel.cohen@sempreflu.com


 
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